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Dossiê PM: A Era das Chacinas
Apresentação
A fim de contribuir para um melhorentendimentoacercados recentes acontecimentosenvolvendo a Polícia Militar e estudantes da USP, elaboramoso presentematerial, a partir derelatórios, notícias e textos coletadosda internet,para esclarecer alguns pontos da questão.Diferentemente do que diz a grande mídia, conhecidamente parcial e tendenciosa, os estudantesda USP, que protestam contra a presença da PM no campus, nãoreivindicamsimplesmentepeloprivilégio de poder fumar maconha impunemente na universidade, tal afirmação soa até absurda.Oincidente envolvendo estudantes portando maconhae aPMfoi apenas o estopim de umainsatisfação muito maior arespeitoda atuação da Polícia Militar, a questão é muito mais profunda:
os estudantes questionam a própria corporação e a sua função na sociedade
.No Brasil, a Constituição Federal de 1.988 proíbe a pena de morte (artigo 5º, inciso XLVII).Entretanto, podemos dizer que ela temsido “aplicada ilegalmente”. São chacinas e execuçõessumárias praticada por forças policiais, em serviço e fora de serviço, e mortes de pessoas que seencontram sob custódia e responsabilidade do Estado. Falamos de mortes que estão diretamenterelacionadas com torturas, maus tratos e condições degradantes a que são submetidos(as) os(as)detentos(as). São também as mortes de adolescentes nas unidades da FEBEM/Fundação CASA.Além das mortes de pessoas internadas em manicômios e casas de internação.A políciae o Estadoutilizama violência letal como uma forma de controle social(intimidando esilenciandoquem ousa questionar uma vidamiserávelesubmissa),direcionando-a, na maioria doscasos, contra pessoas não identificadas, em geral pobres, que são rotuladas como “suspeitas” deterem cometido algum crime ou mesmo de apresentarem uma “atitude suspeita”. As vítimas dessa“pena de morte” são, em sua grande maioria: jovens entre 15e24 anos de idade, moradores dasperiferias das grandes cidades, afro-descendentes em sua grande maioria e pobres no geral.A impunidade em relação aos casos de homicídios nas periferias é enorme. Não existe estímulo porparte dos organismos investigadores do Estado em revelar a autoria de tais mortes, muitas vezesporque existe oenvolvimento de policiais. Casos envolvendo policiais nas resistências seguidas demorte rarasàsvezes são investigados e chegam à justiça. Na sua maioria são arquivados e ospoliciais continuam a agir, sem qualquer responsabilização.A impunidade impera sobre cada um desses casos, o que passa a mensagem de que essas mortessão toleradas, “aceitas” e, em muitos casos, desejadas. Aceitar a morte de qualquer pessoa pelaação ou omissão dos agentes do Estado significa aceitar uma sociedade violenta, cruel,autoritáriae sem respeito aos direitos humanos. Qualquer pessoa pode se tornar vítima dessa “pena demorte”. Certamente que as classes populares são os principais alvos desse horror, já que além deterem seus direitos surrupiados cotidianamente, sevêemfurtados do acesso aos direitos maisbásicos e fundamentais.Por isso, precisamos nos perguntar:
EXISTE PENA DE MORTE NO BRASIL?
(fonte: Dossiê: Mapas do extermínio: execuções extrajudiciais e morte pela omissão do Estado deSão Paulo)
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Metodologia da Morte
É notório o grau de letalidade das polícias brasileiras, sob qualquer ponto de vista que se analise aquestão. Nunca é demais começar lembrando o relatório de Philip Alston, relator da ONU paraExecuções Extrajudiciais que visitou o Brasil em novembrode 2007. Ele especifica explicitamenteque os policiais matam em serviço e fora de serviço.No primeiro caso a justificativa é o "confronto" e a execução é classificada como "resistênciaseguida de morte", porém nenhuma investigação é feita e nenhum policial é punido. Só seinvestiga sobre a vida pregressa do morto, para demonstrar que ele tinha antecedentes penais,portanto com a pretensão de assim justificar a execução. Aponta tambémque os policiais matamquando estão fora de serviço, através de "milícias", "grupos de extermínio" e "esquadrões damorte."No Estado de São Paulo as forças policiais e de segurança que operam nas ruas, composta poragentes do Estado, utilizam diversas métodos para matar:1) O mais praticado é aquele que é descrito como
morte "em confronto" ou em "tiroteio"
entrepessoas que estariam cometendo um delito, ou meramente praticando uma fuga, e agentes doEstado em serviço. Essa morte é registrada no Boletim de Ocorrência como "Resistência Seguida deMorte". O resultado é a totalimpunidade desses crimes através do seguinte mecanismo: ao invésde registrar-se o homicídio do agente do Estado, cabendo a ele e seus superiores provarem que ocrime foi cometido em legítima defesa, o inquérito é desviado para a "resistência" do morto. Comoo morto morreu o inquérito não vai adiante. Porém, no afã de justificar
a posteriori
o crime, élevantada a vida pregressa do morto, na qual frequentemente irá se encontrar passagens pelosistema carcerário ou pela Febem.As ações–por mais distintasque possam ser–seguem um mesmo padrão: “desconhecido éavistado em atitude suspeita e, ao ser abordado, reagiu a tiros. No revide, veio a falecer”. Quandohá mais de um envolvido, o enredo muda um pouco: “abordados em atitude suspeita, enquantodirigiamum carro em alta velocidade, empreenderam fuga, atirando contra os policiais. Aobaterem o carro, um dos ocupantes saiu atirando contra a polícia, sendo atingido, enquanto ooutro conseguiu escapar”.Em todo caso, nessa categoria, tampouco seria possívelinvestigar o homicídio cometido peloagente do Estado porque esta modalidade é acompanhada de outras providências: esteja a vítima já morta ou semimorta, seu corpo é retirado do local do crime e levado para hospitais que passama constar como o local do óbito. A cena do homicídio é desfeita, as cápsulas deflagradas retiradas edesaparecem as evidências eventuais de que não houve confronto. Vários juristas já têm alertadopara o fato de que não existe a figura jurídica da "Resistência Seguida de Morte" e osdefensoresde direitos humanos defendem que essa figura seja banida dos Boletins de Ocorrência.2) Outra forma de matar, ultimamente amplamente disseminada, é
o homicídio praticado poragentes do Estado fora de serviço,
seja trabalhando em "bicos" ilegais, seja em sua vida privada.Também aí a descrição é semelhante à da "Resistência Seguida de Morte". Na narrativa dohomicida, ele, embora esteja à paisana, se identifica e dá "voz de prisão". A pessoa que estácometendo um delito ou que aparenta estar pretendendo cometer atira antes, o que obriga oagente a revidar, resultando, na quase totalidade dos casos, na morte daquele suspeito. A justificativa é a legítima defesa, mas também no caso não há nunca a análise do local do crime, asforças policiais, às vezes o próprio homicida, carregamo corpo (semi-vivo ou morto) para umhospital onde, invariavelmente,o suspeito "não resiste aos ferimentos"
3) A terceira forma de matar, menos frequente mas que começa a generalizar-se, é o que seclassifica em geral de
"bala perdida".
Resulta de uma perseguição tresloucada, às vezes em buscade pessoas que estão cometendo pequenos delitos contra o patrimônio, (delitos de "bagatela"),que investemem locais públicos, sempre em bairros periféricos pobres ou favelas, contra operseguidor, terminando o agente por atirar a esmo. Dessa forma de comportamento dos agentesdo Estado resultam às vezes feridos, às vezes mortos. Quando um agente do Estado mata porengano, depois de criar situações que colocam em perigo a vida de várias pessoas, não podendoargumentar que o morto era um "bandido" ou um "suspeito", a explicação é mística: "foi umafatalidade".4) Além disso, uma forma mais rara, porém existente no Estado de São Paulo e que lembra osprocedimentos da ditadura militar,é
o desaparecimento.
A pessoa é presa por forças policiais,conforme testemunham pessoas da comunidade, e simplesmente desaparece. O maio sangrentode 2006 conta com quatro desaparecidos que foram vistos em mãos de forças policiais e nuncamais apareceram.5) Por fim é preciso registrar os mortos em
chacinas
, cometidas por homens na maior parte dasvezes encapuzados, com toucas ninja ou apenas vestidos de negro–também chamados de "gruposde extermínio"-mas que todos da comunidade sabem serem policiais.Consideramos, pelascaracterísticas das chacinas já desvendadas, que no Estado de São Paulo a maior parte delas écometida por agentes do Estado. A chacina que tem presente a marca de execução policial secaracteriza por: a) muitas vezes é precedida por uma ameaça ou exigência (extorsão) feita porforças policiais oficiais; b) é sempre cometida em locais públicos–praças, bares onde as pessoas sereúnem–como um aviso ao resto da comunidade que "os donos do pedaço" exigem respeito; c)havendo uma ou maispessoas que são o "alvo", todos os presentes são alvejados e em geralmortos; d) em geral os homicidas afastam-se calmamente; e) em geral, logo depois, aparecem–àsvezes sem que tenham sido alertadas–as forças policiais oficiais e praticam o mesmoprocedimento já descrito: desarranjam a cena do crime, recolhem os corpos (semi-vivos oumortos) e encaminham para os hospitais e recolhem as cápsulas deflagradas.A investigação policial raramente consegue desvendar a autoria dessas chacinas, resta saber seseesforça, talvez sabendo que a investigação levaria a seus colegas de trabalho, tendo importância ocorporativismo prevalecente. No entanto, algumas acabam sendo reveladas por outrosacontecimentos. Foi o que aconteceu quando do assassinato do coronel José Hermínio Rodrigues(início 2008): a investigação necessária foi obrigada a reconhecer a autoria de diversas chacinas deencapuzados e diversas execuções sumárias na Zona Norte de São Paulo como sendo cometidaspelos "Matadores do 18", isto é, do 18º Batalhão da Polícia Militar. É também o caso do grupo deextermínio chamado "Highlanders", formado por policiais militares do 37º Batalhão, que na ZonaSul de São Paulo cortava a cabeça de suas vítimas, e que veio à tona em 2009 a partir doassassinato de uma pessoa com deficiência mental.O Observatório das Violências Policiais-SP (http://www.ovp-sp.org/), utilizando-se de fontes daimprensa, cataloga e armazena os dados de todos os crimes praticados por agentes do Estado quese valem da sua posição de autoridade para matar, bem como o nome das vítimas e a data e localdo crime. Cataloga e armazena também os mortos em chacinas com as características acimarelatadas.(fonte: Dossiê: Mapas do extermínio: execuções extrajudiciais e morte pela omissão do EstadodeSão Paulo)
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Dossiê Polícia Militar de São Paulo
A História da PM-SP
A polícia no Brasil(e no mundo)foi criada para ter a função derealizar ocontrole social dosexcluídos e defesa das classes dominantes.A Polícia Militarno Brasilsurge depois dogolpe civil-militar de 64,o decreto nº 1.072 de 30 de dezembro de 1.969 extingui as Guardas Civis do Brasil,anexando-as às Forças Militares Estaduais.O papeldas Polícias Militares(em todo oterritóriobrasileiro)eraode atuar no campo civil com o intuito deinvestigare silenciar possíveis adversáriospolíticos contrários à ditadura militar, de forma azelar pelo regime militar instaurado, sob aalegação de defendera abstrata “segurança pública”.Aorigemda PM-SPnosremeteàcriação da Milícia Bandeirante(MB) em 15 de dezembro de 1.831(anterior a abolição da escravatura, 13 de maio de 1.888).Éda história dessacorporação,orgulhosamente reivindicada pela PM-SP,perseguirnegros ereprimirmanifestações popularesemovimentos sociais,ou seja,coibirqualquer forma deinsubordinação ouquestionamentoàumaordem socialinjustaque explora e oprime a maior parcela da população.No site da PM de SP (http://www.polmil.sp.gov.br/inicial.asp
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A corporação
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Brasão de Armas)podemos verclaramenteno Brasão de Armas da PM-SPa exaltação que a corporação fazà MB.Obrasãoda PM-SPpossui:afigura de um Bandeirante, personagemvergonhoso da históriabrasileira, que adentrava as florestas brasileiras para perseguir escravos foragidos e capturar novos;um Soldado da época da criação da Milícia, que segue a tradição repressora aos excluídos dosbandeirantes; 18 estrelas de cinco pontas, exaltando momentos lamentáveis da história brasileira;entre outros elementos.
BRASÃO DE ARMAS DA PM-SP